quinta-feira, 19 setembro, 2024
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O Portugal que os Portugueses Merecem

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O 25 de Abril é um dia mágico em Portugal. Todas as gerações, de norte a sul do país, saem à rua de cravo na mão, pujança na voz e de sorriso no rosto. São organizados comícios, homenagens, fogos-de-artifício, eventos culturais de todas as artes, enfim, é um dia de celebração da liberdade!

Mas passados 50 anos da instauração do novo regime político (mais) democrático, creio que se importa a questão: somos livres de e para quê?

Arrisco-me a avançar que a cada data festiva trai-se a alma deste dia; a sede de mudança, de progresso, de superação e de liberdade que o período histórico condensado e referenciado no dia 25 de Abril de 1974 representa. Arrisco-me a afirmar também que a data festiva está capturada e que já pouco mais é senão um instrumento político de confirmação e estabilização do regime de governação vigente no nosso país.

Qualquer regime político, qualquer seja a sua natureza, é sustentado não somente através de ideais, projectos, instituições e alocação de poderes, cujos quais nos permitem identificar as características pelas quais este se rege, o seu modus operandi, mas também por via de narrativas pelas quais esse mesmo regime se apresenta, se faz justificar e sedimentar em detrimento de outras formas de organização de uma sociedade.

Ora, o 25 de Abril, enquanto facto histórico, é alicerce fundamental da construção da narrativa que visa legitimar e solidificar o novo regime que se lhe seguiu. Torna-se assim um símbolo da superioridade moral em relação ao que lhe precedeu. Como adiantei anteriormente, possui a insígnia da democracia, da liberdade e do progresso. Poucos são os valores que conseguem competir com estes no que a cativar e entusiasmar as massas diz respeito.

Mas a história é escrita pelos vencedores. Se formos honestos intelectualmente na análise das narrativas que sustentam este quinquagenário regime, percebemos que o constante evocar dos fantasmas do passado está imbuído de um viés ideológico em oposição do puro e objectivo conhecimento e relato da história.

Ao anterior regime são-lhe retirados o seu contexto histórico e méritos produzidos. No mesmo sentido são incessantemente repetidos os seus defeitos.

Creio importar esta referência de modo a fazer menção à resistência religiosa a mudança cultural no que a política e organização da sociedade diz respeito. Portugal vive a fugir do passado em vez de correr para o futuro.

Repare o leitor que, nos restantes dias do ano, talvez com a excepção do Natal, os telejornais abrem com a notícia de mais um hospital sem capacidade de resposta; as manchetes dos jornais ilustram mais um protesto de determinado sector profissional insatisfeito com as suas condições de vida e de trabalho; as conversas nos cafés debatem mais um caso de alegado incumprimento ético no desenrolar de acções governativas.

Não sejamos ingénuos, é certo que o sector da comunicação social persegue objectivos próprios, contudo, é sabido também que esses são factos frequentes e decorrentes de problemas de fundo da nossa governação.

Não posso deixar de mencionar as inúmeras crises que assolam o nosso país, começando pela virtual impossibilidade de se viver em casa própria, afectando especialmente as camadas mais jovens, que, directamente, diminui cada vez mais as perspectivas de resolução da crise demográfica que faz prever transformações avassaladoras no seio da sociedade portuguesa.

A crise no funcionamento dos serviços públicos, desde a supramencionada crise no sector da saúde à do da justiça, da segurança, dos transportes, à de uma Segurança Social moribunda que, a este ritmo, e a curto prazo, será incapaz de dar resposta a todos aqueles que viram os seus rendimentos confiscados a troco de uma ilusão e incompetência política.

A crise dos baixos salários que competem por trabalho pouco qualificado, produtos de uma economia pouco desenvolvida em termos de inovação, industrialização, instalação de capital e crescimento.

A crise do gritante subdesenvolvimento da maior parte do território nacional que se demonstra fatal nas aspirações a um Portugal próspero, assim como na conservação da sua própria história e identidade.

A crise da nossa classe política que se demonstra interessada e preparada não para gerir um país, mas sim para vencer eleições e agarrar o mais alto cargo administrativo possível. A crise subjacente da discussão política que inunda as campanhas eleitorais de slogans e soundbytes puramente de cariz ideológico sem fundamento prático senão o de capturar eleitorado.

A crise literária a todos os níveis, mais evidente no que a política, economia e finanças diz respeito, que, sem grandes surpresas, produz cidadãos dependentes e esperançosos de um messiânico D. Sebastião que venha pegar as rédeas de um sistema de organização governativa e administrativa muito pouco eficiente, dado o tamanho controlo que o Estado Português possui e exerce sobre todas as vertentes de todas as áreas de todos os sectores que perfazem a sociedade portuguesa.

A crise da cultura de percepção do mundo formatada pela glorificação do Estado, da democracia representativa como um fim em si próprio, da universalidade da gratuitidade, da irresponsabilidade, da complacência, da pobreza.

Tudo o que referi anteriormente está intrinsecamente ligado entre si. “As causas do atraso português” é de uma natureza extremamente complexa. Mas as razões pelas quais Portugal prossegue sem se desenvolver tanto quanto o seu potencial evidencia não se prendem com incapacidades naturais dos portugueses. Prendem-se sim com falta de visão e estratégias políticas provenientes de uma máquina asfixiante e devoradora de recursos que centraliza todo e qualquer aspecto da actividade humana nela própria. Porventura haveria muito mais a dizer e desenvolver.

Somos livre de e para quê? Somos livres de um sistema violento e extremamente autoritário para escolher entre uma vida de cão no nosso país ou uma de valor acrescentado no estrangeiro.

A melhor homenagem e a mais bela celebração da liberdade é lutar por ela.

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